Foi-se o tempo em que as fases
para a contratação de um empregado compreendiam, no máximo, um anúncio em
jornal com todos os detalhes ou restrições que a empresa contratante desejava
(ex: idade, sexo, raça, escolaridade, etc), escolha de alguns candidatos para
entrevista, aplicação de testes, escolha de dois ou três finalistas para
entrevista final e definição/ contratação do melhor (nem sempre) candidato.
Hoje em dia, estima-se que mais
de 60% das contratações são originadas da indicação de alguém e cada vez mais o LinkedIn e redes sociais são utilizadas por empresas e profissionais. Outras fontes
também muito utilizadas são: banco de currículos, sites de empregos, anúncios
em jornais e revistas, consultorias de RH, empresas de recolocação e
outplacement, escolas e universidades, cadastros de ex-empregados, entidades e
associações profissionais.
Podemos afirmar que os
procedimentos e técnicas mais utilizadas num processo de recrutamento
tradicional podem abranger:
- Triagem
(identificação dos candidatos que atendem os requisitos mínimos);
- Avaliação
dos conhecimentos e competências através de testes de conhecimentos (gerais, idioma,
informática, etc), aptidão
(raciocínio lógico e atenção concentrada) e habilidade (redação / comunicação escrita);
- Análise do
perfil comportamental: Testes situacionais, de personalidade,
dinâmicas de grupo, entrevista (estruturada, não estruturada, de
competência, situacional, coletiva, por computador e técnica ou com o
requisitante);
- Pesquisa de
referências;
- Exame Médico;
e
- Laudos e pareceres sobre o entrevistado.
Se no passado não havia maiores
preocupações além da escolha do melhor candidato, agora os recrutadores e as
empresas em geral devem atentar para uma série de aspectos e cuidados que
precisam ser seguidos durante o processo de recrutamento a fim de se evitar
situações ou circunstâncias que podem vir a gerar ações e indenizações no
âmbito trabalhista.
Por que?
Em primeiro lugar precisamos ter em mente que, embora a
empresa (por assumir os riscos da atividade econômica), tenha o direito de
contratar o empregado que melhor lhe convenha e de acordo com as atribuições e
competências do cargo, ela pode ultrapassar os limites assegurados pela
constituição federal do direito ao trabalho, à igualdade e à dignidade da
pessoa e, mesmo sem nenhuma intenção, cometer algum ato discriminatório durante
o processo seletivo. Outrossim, nos termos do artigo 1º da Lei 9029/95, é
proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito
ou a manutenção da relação de emprego.
Mas que circunstâncias ou atitudes podem caracterizar um ato
discriminatório no processo de seleção?
De imediato, podemos mencionar o próprio anúncio, o qual não
pode fazer distinção, entre outras, de: raça, sexo, idade, nacionalidade,
condição física, orientação política, religiosa, preferência sexual e
filosófica.
Apesar de muitos anúncios veiculados ferirem alguns desses
aspectos, continuam sendo publicados e, em minha opinião, estão sujeitos a:
- possível instauração de processo investigatório por parte do Ministério Público do Trabalho com aplicação de multa ou proposta de acordo com “Termo de Ajustamento de Conduta” no qual a empresa se compromete a não mais veicular anúncios com qualquer circunstância discriminatória; e
- caso algum candidato à vaga sentir-se prejudicado ou discriminado, o mesmo poderá denunciar a empresa junto ao sindicato da categoria ou até ajuizar uma ação indenizatória.
Dois outros exemplos muito comuns de meios que podem ser
considerados discriminatórios são:
- obtenção de “Atestado de Antecedentes Criminais”; e
A existência de um fato no passado do candidato (com a pena
integralmente cumprida perante a lei) ou a inserção como devedor no cadastro de
proteção ao crédito, em princípio, não devem ser motivos para a
desclassificação de qualquer candidato a um novo emprego, pois se levado às
instâncias judiciais, provavelmente serão interpretados como atos
discriminatórios, tendo em vista que, no primeiro caso, é através de um emprego
que a pessoa poderá iniciar o resgate de sua dignidade humana e auto-estima e
no segundo caso, o candidato estaria sendo duplamente penalizado, pois seria
através do novo emprego que teria condições de adimplir sua dívida.
É óbvio que por parte das empresas (para a obtenção do
atestado de antecedentes criminais ou a consulta aos órgãos de proteção ao
crédito) teriam como argumento a previsão do artigo 7º, XXXIV da Constituição
Federal que assegura a todos, o direito de receber dos órgãos públicos,
informações de seu interesse particular.
Neste aspecto, compartilho com aqueles que entendem que é difícil provar
quais são os reais interesses e, como
decorrência, estaria caracterizada a discriminação.
Princípio da igualdade
Toda essa questão da discriminação encontra amparo no
princípio da igualdade, previsto no artigo 5º da Constituição Federal que
estabelece:
"Art. 5o. Todos são iguais perante a lei, sem distinção
de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade...”
Esse princípio, como todos os outros, pode, no entanto, ser
relativizado, de acordo com cada situação concreta, pois a doutrina e a
jurisprudência asseguram às pessoas de situações iguais, os mesmos direitos,
prerrogativas e vantagens, com as obrigações correspondentes, o que significa,
conforme ensina o Dr. Celso Ribeiro Bastos (Curso de Direito Constitucional,
SP, Saraiva, 1978, p.225), “tratar igualmente os iguais e desigualmente os
desiguais na medida em que eles se desigualam” e o grande mestre Rui Barbosa em
seu famoso discurso “Oração aos moços” (1920): “A regra da igualdade não
consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se
desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é
que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são desvarios da inveja, do
orgulho, ou da loucura. Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com
igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real."
Considerações Finais
Para finalizar, embora algumas delas possam ser consideradas
como “cuidado exagerado”, recomendo observar as boas práticas no recrutamento e
seleção de funcionários, as quais contemplam, entre outros:
1. O candidato não pode ser exposto a nenhum tipo de
discriminação (raça, sexo, idade, nacionalidade, filosóficos, físicos,
preferência sexual, política ou religiosa).
2. Qualquer atividade proposta ao candidato deve respeitar
suas características físicas, integridade, segurança e privacidade.
3. O candidato não pode ser exposto a perguntas ou situações
que possam gerar constrangimentos, desrespeito ou serem interpretadas como
assédio.
4. As entrevistas devem ser realizadas em locais reservados
e é recomendável que o candidato seja informado antecipadamente sobre todas as
etapas do processo e testes.
5. Quando houver
aplicação de testes, assegurar que os mesmos estejam atualizados, o avaliador
seja profissionalmente qualificado e, garantido ao candidato, espaço adequado e
os instrumentos necessários à realização dos mesmos.
6. Após cada fase, informar as subsequentes e uma previsão
de data para o retorno, mantendo o candidato informado após cada etapa do
processo seletivo.
7. Avisar o candidato
se o processo de seleção se prolongar mais do que o previsto.
8. Assegurar que os mesmos procedimentos éticos estejam
sejam adotados por todos os participantes (de qualquer nível ou área) do
processo.
9. Assegurar que qualquer outro participante do processo
esteja qualificado e tenha treinamento adequado para exercer as funções de
seleção em todas as suas fases.
10. Todos os dados e informações obtidas nos processos
seletivos devem ser tratados confidencialmente e no estrito âmbito dos
profissionais que estão participando do processo.
Lembre-se que, em geral, a maioria dos candidatos a um
emprego traz dentro de si a esperança e o sentimento de uma nova e melhor
perspectiva para sua vida e de sua família. Portanto, só isso basta para que o
processo seja conduzido com muita dignidade e respeito profissional.
Bom trabalho e até breve!
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