I.
Introdução
Quase todas as pessoas que
trabalham há mais de vinte anos, no passado, provavelmente já vivenciaram
e/ou, no mínimo, presenciaram algum fato caracterizador do assédio moral e, no
entanto e pelas mais variadas razões, mantiveram-se em silêncio ou apenas
comentaram veladamente nos seus círculos de relacionamentos mais próximos
(dentro ou fora das organizações).
Até poucos anos, muitas
circunstâncias caracterizadoras do assédio moral eram quase sempre consideradas
(às vezes até mesmo pelos assediados) como “normais” dentro de um ambiente de
trabalho, entendendo-as como gozações, “broncas” de chefes, respeito distorcido
aos superiores (do tipo “manda quem pode e obedece quem tem juízo”),
divergências e/ou diferenças de posicionamento e preferências pessoais ou
profissionais. Até então, convivia-se com o assédio e mesmo aqueles que o
consideravam como forma de ofensa, menosprezo, constrangimento ou humilhação,
continuavam desenvolvendo suas atribuições e responsabilidades e, quando muito,
comentavam ou desabafavam com familiares, amigos e/ou pessoas de sua confiança.
A realidade é que o assunto
começou a ser identificado como uma forma de violência moral no trabalho
somente na década dos anos de 1980 através de pesquisas realizadas nas áreas da
psicologia e psiquiatria por Heinz Leymann, tornando-se objeto de estudos
iniciais na Suécia e posteriormente na Alemanha. Em meados da década seguinte, a OIT
(Organização Internacional do Trabalho) chamava a atenção para o problema em
diferentes países e mais recentemente, também o Fundo Europeu para Melhoria das
Condições de Trabalho e de Vida (Fundo Dublin 2000) reconheceu o assédio moral
como um problema internacional.
No Brasil, somente no início da
última década é que o assunto começou a ganhar força, após a divulgação da
pesquisa brasileira realizada como tema de dissertação de mestrado (Uma jornada
de humilhações) em Psicologia Social – PUC/SP - Maio/2000, pela Dra. Margarida
Barreto. Portanto, muitas das informações constantes deste artigo foram
obtidas, e fazemos questão de destacar, no site www.assediomoral.org/, o qual foi
criado e é mantido por vários profissionais (de diferentes áreas de atuação)
preocupados com o problema e engajados na luta contra o fim do assédio moral no
trabalho.
II.
Assédio
moral: o que é? E os impactos sobre o ambiente de trabalho?
De maneira bem simples, podemos definir o assédio moral como sendo aqueles comportamentos abusivos e humilhantes, expressos através de gestos, palavras e atitudes que possam prejudicar a integridade física ou psíquica de uma pessoa, desde que ocorram repetitivamente, os quais, também, acabam contribuindo decisivamente para a deterioração do ambiente interno de trabalho.
De outro lado, muito embora seja mais comum a ocorrência do assédio de
superiores hierárquicos contra seus subordinados (conforme veremos mais à
frente), o mesmo também pode ocorrer entre colegas do mesmo nível (ex: colocam
em xeque a masculinidade de alguém) e até mesmo entre grupos de funcionários em
relação a determinado chefe (ex: espalham boatos negativos sobre o comportamento
da esposa do mesmo).
Ambientes de trabalho onde são observados comportamentos de assédio moral
são caracterizados, entre outros:
·
pela
deterioração nas relações humanas;
·
desrespeito
aos princípios básicos da boa convivência;
·
queda na
qualidade e na produtividade;
·
maior
probabilidade de perda de confiança no comando da organização;
·
falta de
comprometimento;
·
aumento
do absenteísmo, doenças e acidentes do trabalho;
·
maior
rotatividade da mão-de-obra;
·
aumento
do número de reclamações trabalhistas;
·
baixos
níveis de motivação, criatividade e iniciativa;
·
trabalhadores
com baixa “auto-estima”;
·
predominância
de atitudes individualistas (falta de espírito de equipe);
·
maior
tensão, irritabilidade e agressividade dos trabalhadores.
III.
O que pode caracterizar o assédio moral?
Embora não contemple todas as hipóteses e sempre lembrando que a
caracterização do assédio moral depende das reincidências ou frequências com
que os fatos ocorrem, segue abaixo, uma série de comportamentos e atitudes que
podem ser considerados como tal:
- Ameaçar o empregado constantemente de demissão;
- Dispensar tratamento preconceituoso contra trabalhadores
doentes ou acidentados;
- Constranger e/ou humilhar publicamente o funcionário;
- Autoritarismo e intolerância de gerências e chefias;
- Imposição (repetidas vezes) de jornadas extras de trabalho;
- Espionar e vigiar os trabalhadores;
- Desmoralizar e/ou menosprezar os funcionários;
- Assédio sexual;
- Isolamento e segregação de trabalhadores por parte de
gerências e chefias;
- Desvio frequente de função;
- Insultos e grosserias de superiores;
- Calúnias e inverdades dissimuladas no ambiente de trabalho
por chefias;
- Negação por parte da empresa de laudos médicos ou comunicações
de acidentes;
- Discriminação salarial segundo sexo, etnia ou religião;
- Ameaças a trabalhadores sindicalizados;
- Punição aos trabalhadores que recorrem à Justiça;
IV.
O assédio moral e o dano moral
Para muitos interessados no tema, assédio e dano moral são a mesma
“coisa”. Todavia, de acordo com o Dr. Robson Zanetti, advogado (Doctorat Droit Privé
Université Panthéon-Sorbonne), em
artigo no site www.administradores.com.br
esclarece que “ao serem analisadas as condenações na Justiça do
Trabalho...chega-se a conclusão que não existe um posicionamento claro sobre o
assunto”.
Como sempre procuro fazer, não entrarei no mérito de uma discussão jurídica, até porque não é este o objetivo desta abordagem, porém compactuo com aqueles que entendem que assédio moral e dano moral são “coisas” diferentes.
Resumidamente,
consegui identificar algumas características específicas de cada um:
Assédio Moral Dano
Moral
* Sua caracterização
nasceu como uma * Nasceu como tese
jurídica
tese médica (no campo da psiquiatria)
* Conduta abusiva,
repetitiva e prolongada * Pode ocorrer em
decorrência de um fato
* Prejuízo precisa
ser provado (ex: doença) * Prejuízo pode
ser baseado na presunção
* Não impõe levar ao
conhecimento de * Em matéria de prova,
entende-se ser
terceiros (como prova) necessário levar ao conhecimento de 3ºs
* Causa de dor e
sofrimento comprovados * Pode não causar
dor e/ou sofrimento
Em conclusão a este tópico, parece-me que as características próprias
acima destacadas de cada instituto são suficientes para demonstrar tratarem-se
de “coisas” diferentes. Assim, o
enquadramento como assédio moral ou dano moral depende, essencialmente, da
verificação e análise detalhada dos fatos, de acordo com as provas e
informações apresentadas pela pessoa lesada.
V. O que as empresas podem fazer
preventivamente
Vivemos num mundo capitalista, onde a
competitividade é incentivada em todos os níveis e contextos dentro das
organizações e, infelizmente com isso, contribuindo para ações, atitudes e
comportamentos – especialmente por parte dos superiores hierárquicos - que
agridem e degradam as relações humanas.
O assédio moral é um ato de violência ao ser
humano e deve ser coibido de todas as formas, pois muitas vezes finge-se não
vê-lo ou tolera-se determinados comportamentos que o encorajam. Por isso, todas
as empresas sérias e responsáveis, independentemente do porte, devem estar
atentas ao problema e, como prevenção, podem:
·
Conscientizar seus colaboradores sobre o que é o assédio
moral;
·
Criar programas de prevenção;
·
Desenvolver formas mais estruturadas de organização do
trabalho e rever seus métodos de gestão das pessoas;
·
Dispor de canais de comunicação mais abertos e
incentivando políticas de qualidade de vida;
·
Treinar e preparar pessoal de comando dentro de práticas
de gestão que incentivem a educação, confiança, cooperação e respeito humano,
de forma que sejam exemplos para todos os colaboradores;
·
Não admitir, em hipótese alguma, atitudes e
comportamentos de desrespeito ao ser humano;
V.
Considerações Finais
O assédio moral deve ser repudiado, pois além dos
males que representa para as organizações, repercute também na sociedade,
atingindo questões familiares, separações conjugais, uso de drogas e
alcoolismo, entre outros e invade o campo da saúde pública com o aumento de
doentes físicos e mentais.
Todos são responsáveis: patrões, dirigentes,
executivos, gerentes, supervisores, chefes ou simples funcionários. Cada um
dentro de seu campo de atuação não pode se eximir e se calar.
Eu estou fazendo a minha parte e você?