terça-feira, 5 de julho de 2016

Monitoramento corporativo: restrição à privacidade do funcionário


Ao iniciar a pesquisa sobre o tema, veio-me à mente o livro “1984” de  George Orwell, o qual foi escrito em 1948 e que falava de um mundo imaginário dominado por um regime totalitário que ressaltava – metaforicamente e entre outras coisas – uma realidade que parece estar sendo disseminada de forma acelerada em nossos dias: a invasão de privacidade e os avanços tecnológicos propiciando a vigilância total das pessoas.

Há cada dia é notório o aumento da quantidade de câmeras instaladas nas ruas, avenidas, estradas, empresas, prédios e residências e ficamos com a sensação de que estamos sendo vigiados à todo momento. Se por um lado, esse aparato pode nos transmitir uma falsa sensação de segurança, por outro, nos faz sentir invadidos em nossa privacidade, gerando uma preocupação absolutamente compreensível: até onde tudo isso vai?

Evidentemente, o objetivo desta breve introdução, não é iniciar uma discussão ampla sobre o assunto, mas tão somente lembrar que também é uma questão que atinge e preocupa as empresas e seus colaboradores e, por isso, é nessa direção que passamos a focar nossa abordagem.

É crescente a preocupação das empresas em relação à segurança patrimonial, propriedade intelectual e sigilo industrial e, como consequência e tendo como aliada a tecnologia, vão sendo criadas novas formas de vigilância e monitoramento, as quais, nem sempre  são aceitas com naturalidade pelos empregados (entendem que estão tendo suas privacidades invadidas) e muitas vezes podem significar problemas futuros para as empresas.

É compreensível que a vigilância nos ambientes corporativos nasce da preocupação que as empresas têm no sentido de que seus funcionários utilizem as horas de trabalho das formas mais produtivas possíveis. O grande problema é: até que ponto o monitoramento e vigilância são possíveis e não invadem a privacidade do empregado?

Objetivando contribuir no assunto, a seguir abordamos algumas formas de monitoramento corporativo que têm gerado mais controvérsias.

 

·         Revistas pessoais e de armários dos empregados

Antes mesmo da introdução dos avanços tecnológicos, o assunto já gerava (e continua gerando) polêmica, uma vez que até hoje não existe previsão legal, estando a matéria analisada apenas no âmbito da doutrina e da jurisprudência.

Doutrinariamente, a controvérsia baseia-se nos princípios constitucionais do respeito à intimidade, dignidade e honra da pessoa. De um lado há os que entendem que ao revistar o empregado ou seus pertences, estar-se-á possibilitando que a empresa tenha acesso à informações de caráter estritamente pessoal e de outro, há os que entendem que a revista – quando necessária e realizada de forma conveniente - é um direito da empresa como prevenção a furtos e outros eventuais prejuízos.

No âmbito jurisprudencial, o entendimento majoritário é pela sua possibilidade, porém a controvérsia está relacionada mais à forma como ela é realizada, a fim de não causar nenhum constrangimento, humilhação ou exposição indevida do empregado à frente de seus colegas.


·         Vigilância interna – câmeras de vídeo

Hoje em dia é uma das formas mais utilizadas pelas empresas pois possibilita o monitoramento de todo ambiente de trabalho e contribui na vigilância patrimonial ao realizar a gravação de imagens que podem ser posteriormente analisadas.

Apesar de ser uma das formas mais utilizadas, muitas empresas continuam correndo riscos de futuras ações trabalhistas e/ou cíveis, entre outras coisas, por:

  • não informar os funcionários que o ambiente de trabalho é monitorado por câmeras de vídeo;
  • instalar câmeras em áreas que podem criar situações constrangedoras (ex: banheiros, vestiários e refeitórios) e/ou somente em algumas áreas, setores ou departamentos da empresa;
  • divulgar, indevidamente, certas imagens gravadas.

·         Escuta telefônica

Como regra geral, a violação do sigilo das comunicações sem a autorização dos interlocutores é proibida, uma vez que a Constituição assegura o respeito à intimidade e vida privada das pessoas e, portanto, aplica-se também às comunicações telefônicas.

Embora não seja uma prática comum, exceto nos serviços de telemarketing ou assemelhados em que as ligações telefônicas entre o funcionário da empresa e o cliente podem ser gravadas a fim de garantir a fidelidade das ações tomadas, ainda existem organizações que entendem que a escuta telefônica (em geral) é legal sob o argumento da necessidade de monitorar as conversas relacionadas às atividades laborais do funcionário. Particularmente, entendo que as empresas que se utilizam desse método estão sujeitas a ações trabalhistas e cíveis pois podem estar violando a intimidade de seus empregados.
 

·         Internet , e-mails e redes sociais

Deixamos este como último item de abordagem, pois parece-me que vem tornando-se uma das principais preocupações das empresas, uma vez que com a tecnologia fazendo parte do dia-a-dia das organizações e da maioria das pessoas, é crescente a utilização inadequada da Internet, e-mails e rede sociais por parte dos empregados.

A liberdade de acesso aos sites em geral, a utilização de e-mails de forma indiscriminada e a possibilidade dos empregados participarem de redes sociais sem qualquer vigilância podem representar formas que fragilizam a segurança nas comunicações e contribuem para a ocorrência de crimes virtuais e possibilidade de grandes prejuízos para as organizações. Por isso, a cada dia aumenta os bloqueios aos acessos e  investimentos no monitoramento dos funcionários.

Certamente, não são poucos os casos em que a utilização da Internet, de redes sociais e e-mails pessoais durante o expediente de trabalho colocaram as redes de muitas empresas em risco, seja em razão de vírus, hackers mal intencionados e golpistas que se aproveitaram de um momento de distração de algum funcionário para a concretização de crimes virtuais.

Outrossim, também não podemos nos esquecer que a utilização imprópria das redes sociais também podem gerar problemas para as empresas. Apenas como exemplo, lembro-me de um caso ocorrido há algum tempo, quando um diretor de uma empresa, após a vitória de seu time de futebol sobre outro grande clube brasileiro, postou mensagens em seu twitter, “gozando” a equipe e torcida adversária, com destaque ao nome de sua empresa. O grande problema é que a tal empresa era uma das patrocinadoras da equipe adversária naquela partida e, em razão disso, a mesma sentiu-se no dever de vir a público desculpar-se oficialmente e, na seqüência, demitiu o executivo torcedor. Certamente, outras histórias parecidas com esta não tem sido tão incomuns!

Também é importante destacar que além dos riscos mencionados, estima-se que um funcionário desperdiça quase 2 horas de seu dia com assuntos improdutivos relacionados com a má utilização da Internet e Redes Sociais. Esse fato, por si só, demonstra o grau de perdas que uma organização pode incorrer!

Considerando todas as variáveis de riscos e improdutividade relacionadas, alinho-me com aqueles que entendem que, entre outras coisas:

·         a utilização e acesso livre à quaisquer sites da Internet não deve ser autorizada pelas empresas;

·         a empresa tem o direito de restringir o uso da Internet, e-mails e redes sociais;

·         se a empresa pretender monitorar seus funcionários quanto à utilização desses instrumentos, ela deve comunicar previamente os mesmos, estabelecendo as devidas regras e condições de uso, destacando a finalidade estritamente profissional;

·         a empresa deve orientar os funcionários no sentido de que durante o expediente, o tempo deve ser utilizado da forma mais produtiva possível e que o acesso às redes sociais, páginas da Internet e utilização inadequada do e-mail poderão prejudicá-los no desenvolvimento profissional; 

·         a empresa deve investir em mecanismos para a proteção contra ataques virtuais e que podem trazer danos à sua imagem.
 

·         Considerações finais

Ao finalizar este artigo, chamo a atenção dos funcionários usuários das ferramentas tecnológicas que são disponibilizadas pelas empresas, para o bom uso das mesmas, pois entende-se que os sistemas, e-mails e acesso à Internet e redes sociais, quando necessários e/ou como apoio à execução das atividades laborais pertencem ao empregador e qualquer prejuízo originado do mal uso desse arsenal tecnológico é de responsabilidade da organização, sendo – inclusive - admissível  a proibição de acessos indesejáveis ou não necessários às atividades de cada funcionário.

Portanto, todo profissional deve estar atento à sua postura e atitude no bom uso dessas ferramentas, adequando-se às regras e normas estabelecidas pela empresa.

Para as empresas, em havendo o monitoramento, fica a recomendação da comunicação prévia, inserção das regras de uso nos contratos de trabalho ou de prestação de serviços, nas políticas e normas internas, nos códigos de conduta dos funcionários, na própria interface gráfica quando a rede é acessada e também nos rodapés dos e-mails. O monitoramento feito de forma correta reduz os riscos de problemas, protege a empresa e o bom funcionário e ajuda a responsabilizar o mau usuário.

E você, caro leitor, como vem utilizando as novas tecnologias no seu dia-a-dia?

 
Autor: Carlos A. Zaffani  -  Consultor em Gestão de Empresas